A motivação para ser livre é fazer o que se quer.
A propaganda dá o tom do movimento libertário, em que ser livre é soltar a voz nas estradas, passar adiante qualquer tipo de notícia; em que a opinião pode ser qualquer uma, agressiva, repressiva, hilária, criadora de bullying ou simplesmente opinião. Desde que manifeste a liberdade de expressão, que seja.
Conclui-se, nos meios pensantes e intelectualizados, que a arte deve ser exprimida como o artista a vê: com as pecularidades e genialidades próprias de sua origem numa pessoa com capacidade de discernimento e direcionamento para a arte.
Conclui-se que, quem é capaz de tamanha genialidade, também deve ter a devida medida sobre a maneira como vai direcionar a sua arte e para quem. Escrever é uma arte complicada, pois tanto pode denegrir como elevar a imagem de uma pessoa. O mesmo se dá em qualquer âmbito artístico, onde a expressão artística pode não ser a mais conveniente para quem é direcionada.
Conclui-se, ainda, que a única maneira de um grupo de inclinaçôes radicais expressar-se com liberdade é agindo como ele sabe, do único modo que considera a realização de suas pretensões como entusiasta de seus planos: aterrorizando e matando, para mostrar que pode suprimir na marra o que desgosta da sociedade que o reprime.
De certa forma, cabe ao bom senso dos jornais, revistas, internet e afins, limitar este transtorno de vais-e-vens de atentados.
Com alerta máximo contra o terrorismo na França, repete-se o mágico circo de fogo, com nações amigas se unindo, mais uma vez, para bombardear esconderijos e invadir territórios já sofridos pela imposição dos rebelados e mentores de uma leitura errônea dos ensinamentos de Maomé e semear mais ódio na guerra religiosa sem fim.
Contra qualquer tipo de violência, incluo aqui a violação dos princípios básicos da boa educação; princípios estes que reputo muito mais adequado partir de pessoas capacitadas: será que valeu tanta brincadeira ( nem sempre tão inocentes assim ) dos chargistas do Charlie Hebdo ? Sabendo da falta de humor de seguidores de grupos alinhados aos extremos da compreensão religiosa islâmica, para que exporem-se a tal julgamento?
Gentileza gera gentileza. Agressão gera agressão. E torna-se um ciclo vicioso de quem tem mais direito para matar.
A liberdade de expressão tem lados e feições.
A liberdade de expressão tem idas e vindas.
O respeito ao próximo e a sua crença; suas individualidades e costumes configurados no seio da tradição de cada povo; a não imposição das crenças ocidentais em um mundo particular onde civilizações estão plasmadas em camadas de séculos e séculos de história...seria o fim dos conflitos.
O grande problema, no entanto, vai mais além da carochinha da pendenga religiosa. A riqueza do solo do Oriente Médio cria modelos de intervenções a cada nova temporada.
Na verdade, detesto esta recriação de Alexandre, o Grande. Europa e Estados Unidos amam estas releituras de novas Cruzadas, de sagas de Gengis Khan, dominando o mundo e moldando-o da forma como Roma o fazia, avalizando as cidades como romanas se estas tivessem o projeto romano.
As trincheiras se recrudescem quando as armas de uns são as palavras e as de outros são metralhadoras. Bastava que os grandes do Charlie Hebdo tivessem algum cuidado com a leitura de que, com cabeças inclinadas a exageros ideológicos, como só os radicais extremistas islâmicos as têm, não impusessem a mesma caricatura extremista do ocidental cristão abençoado com a democracia e a plena liberdade de exercê-la.
O toma-lá-dá-cá das ideias e a imposição dos próprios valores não levam a lugar algum, somente a mais um fracasso das relações humanas.
A França já tentou vetar as cabeças cobertas das mulheres muçulmanas dentro de sua terra livre, impondo o costume de suas livres mulheres num espaço que pode ser dividido e escolhido com o costume de cada um.
Assim é no Brasil, com o seu diálogo religioso e sem causar mal-estar em quaisquer crenças.
Assim deveria ser sempre, com cuidado e sem imaginar que religiões são o mal do mundo, mas apenas um caminho de encontro com a divindade escolhida.
Conclui-se que matar não é mais negócio de grande valia.
Conclui-se que a liberdade real é a que se expressa com o devido respeito às diferenças, excluindo a malfadada intenção de bulir com a liberdade alheia.
08/01/2015